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Folha de São Paulo erra na sugestão de exercícios

Sempre que encontro uma boa matéria no Caderno Equilíbrio da Folha de São Paulo, uso como gancho para meus posts e não foram poucas as vezes que fiz isso, pois trata-se de uma publicação bem conceituada e com assuntos atuais. Quando o caderno do dia quatro de junho chegou em minhas mãos, fiquei entusiasmada, a matéria de capa era justamente sobre a área que tenho especialização: atividade física adaptada e saúde.

Com o título: “Na saúde e na doença” (clique aqui e leia na íntegra), o caderno equilíbrio chamava para conhecer os melhores exercícios para quem tem problemas como hipertensão, lombalgia, asma e osteoporose. A matéria começa bem, explicando que os exercícios podem melhorar a condição do doente e que quando bem direcionados podem fazer parte do tratamento. Ressaltam que além das condições individuais, deve-se avaliar o estado do distúrbio e as variáveis de cada atividade física.

O problema veio com a prescrição dos exercícios. Alguns acertaram na mosca, já outros…

Asma

A indiação foi correta: natação. Alertaram para os cuidados com a alergia que o cloro pode causar, sobre a intensidade do exercício e a contraindicação durante as crises. O erro apareceu nas opções de atividades, uma das sugestões foi a corrida. Salvo em casos leves e condições muito bem controladas o asmático não deve praticar corrida, sob o risco de desencadear uma crise. Outras atividades na piscina ou próximas ao ambiente aquático seriam as melhores pedidas.

Artrose

Aqui ocorreu o mesmo, a prescrição foi acertada, musculação em aparelhos, com cargas leves a moderadas e poucas repetições. O problema, novamente, foi a opção de atividade: bicicleta. Considerando que o os membros inferiores sejam acometidos (se forem nos membros superiores pode pedalar a vontade!) o uso da bicicleta irá sobrecarregar tanto a articulação do quadril quanto a do joelho, pela contínua flexão de ambos (sem contar a observação feita sobre a regulagem do selim – mais elevado e para a frente). Uma caminhada seria muito melhor, ainda assim dependendo do grau de acometimento.

Câncer

Tudo perfeito! Aeróbica+musculação+alongamento e como opção caminhada ou bicicleta, em intensidade leve a moderada.

Lombalgia
A indicação foi Pilates. Correto desde que a pessoa fique atenta ao que está na matéria, o programa de exercícios deve ser individualizado e iniciantes devem fazer aula em estúdio. Os exercícios de pilates visam muito o fortalecimento da região abdominal o que auxilia na manutenção da postura ereta e por consequencia na diminuição de lombalgias, mas é preciso ter cuidado, pois muitos dos exercícios de pilates acabam sobrecarregando a coluna de quem não está preparado, causando o efeito oposto. Leia: Pilates e dor nas costas.

Fibromialgia

Aqui também está tudo ok! Hidroginástica e como opção musculação com carga baixa e dança com objetivo recreativo. Leia: Atividade física ajuda quem tem fibromialgia

Hipertensão

A prescrição de caminhada ou corrida + exercícios isotônicos + yoga com ênfase na respiração e meditação foi acertado, faltou apenas dizer para evitar os exercícios isométricos. Como opção aparece a natação e aqui é que mora o problema. A natação pode ser benéfica para o hipertenso, como mostram diversos estudos, mas devem ser tomados alguns cuidados pois inicialmente a imersão na água, principalmente se for aquecida, acarreta sobrecarga cardiorespiratória com aumento da frequência cardíaca podendo trazer consequência graves para o hipertenso não controlado.

Osteopenia

Dança flamenca ou musculação. Eu diria que o inverso é o melhor. Como opção de atividade indicaram a caminhada ao ar livre. Para entender melhor leia: Prevenindo a osteoporose: como o exercício fortalece o ossos?

A mídia tem uma função importantíssima: informar. Na maioria das vezes é através das informações que obtemos de forma impressa ou eletrônica que conseguimos avaliar se estamos sendo orientados pelos profissionais que nos atendem de forma correta, isso em qualquer âmbito e não apenas da saúde. No meu último post “Seu professor da academia está bem preparado?”, recebi algumas críticas questionando como saber se o professor está agindo de forma correta ou não, uma das maneiras seria buscar informações na mídia. E quando a mídia erra? Complicado né?! O jornalista não tem a obrigação de conhecer sobre todos os assuntos, para isso busca fontes, que julga adequadas, para prover essas informações. Neste caso o pecado cometido pela Folha foi correr para o lado mais fácil, profissionais de três academias foram a fonte, além de médicos e fisioterapeutas. Onde está o problema? Na especialização desses profissionais.

Médico: pode indicar a prática de atividade física, pode indicar os limites para essa prática (ex.: frequência cardíaca, ângulo de movimento), mas não pode prescrever e supervisionar a atividade.

Fisioterapeuta: pode prescrever e supervisionar a atividade quando esta visa a reabilitação, não pode prescrever  a atividade visando o condicionamento físico.

Educador Físico: Pode indicar a prática de atividade física, pode indicar os limites para essa prática e pode prescrever e supervisionar a atividade ou o exercício com o objetivo recreativo ou de condicionamento físico. Não pode prescrever exercício visando a reabilitação.

Além disso, da mesma forma que um médico ginecologista não seria consultado para uma pauta sobre cardiologia um professor de natação não deveria ser questionado sobre judô ou futebol. Em ambos os casos os profissionais têm a mesma formação básica, mas a específica é bem diferente.

Para essa matéria a Folha Equilíbrio deveria ter buscado as informações com profissionais de Educação Física especializados em Atividade Física Adaptada e Saúde. É uma área ampla, que oferece pós-graduação (especialização) em diversas cidades do país, coordenadas pelo meu querido Prof. Dr. Luzimar Teixeira, grande responsável por despertar meu interesse pela área, desde a graduação, e orientador da minha monografia de pós-graduação. Isso não significa que os professores consultados desconheçam os problemas, mas se é possível encontrar professores que aprofundaram seus estudos em populações com cada uma das patologias citadas, porque não procurá-los?

O resultado está aí, publicado. Quem sai perdendo? Aquele que leu, confiou na informação e deu azar escolhendo justo a atividade menos indicada. Nos resta apenas torcer para que não tenha seu problema de saúde agravado, que encontre um bom professor de educação física que o oriente a tempo e que a mídia busque sua fontes com mais propriedade para não errar da próxima vez.

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